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AVE MARIA by Leo Rojas - SOUL BIRD

Não Digas Nada!


Não digas nada!
Nem mesmo a verdade
Há tanta suavidade em nada se dizer
E tudo se entender —
Tudo metade
De sentir e de ver...
Não digas nada
Deixa esquecer

Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda essa viagem
Até onde quis
Ser quem me agrada...
Mas ali fui feliz
Não digas nada.

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

"As Minhas Asas"

Eu tinha umas asas brancas,
Asas que um Anjo me deu,
Que, eu me cansando da terra,
Bati-as, voava ao céu.

- Eram brancas, brancas, brancas,
Como as do Anjo que mas deu:
Eu inocente como elas,
Por isso voava ao céu.


Veio a cobiça da terra.
Vinha para me tentar;
Por seus montes de tesouros
Minhas asas não quis dar.
- Veio a ambição, co'as grandezas,
Vinham para mas cortar
Davam-me poder e glória
Por nenhum preço as quis dar.

Porque as minhas asas brancas
Asas que um Anjo me deu
Em eu me cansando da terra
Batia-as, voava ao céu.


Mas uma noite sem lua
Que eu contemplava as estrelas,
E já suspenso da terra,
Ia voar para elas,
-Deixei descair os olhos
Do céu alto e das estrelas...
Vi entre a névoa da terra.
Outra luz mais bela que elas.

E as minhas asas brancas,
Asas que um Anjo me deu,
Para a terra me pesavam,
Já não se erguiam ao céu.


Cegou-nos essa luz funesta
De enfeitiçados amores...
Fatal amor, negra hora
Foi aquela hora de dores!
-Tudo perdi nessa hora
Que provei nos seus amores
O doce fel do deleite,
O acre prazer das dores.

E as minhas asas brancas,
Asas que um Anjo me deu
Pena a pena me caíram...
Nunca mais voei ao céu.

                    Almeida Garrett

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