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AVE MARIA by Leo Rojas - SOUL BIRD

Não Digas Nada!


Não digas nada!
Nem mesmo a verdade
Há tanta suavidade em nada se dizer
E tudo se entender —
Tudo metade
De sentir e de ver...
Não digas nada
Deixa esquecer

Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda essa viagem
Até onde quis
Ser quem me agrada...
Mas ali fui feliz
Não digas nada.

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

A Ti ... PAIzinho

Olá Paisinho;

Sim! Era assim que te chamava, é assim que te vou continuar a chamar.
Vais-me perguntar porque criei este blogue. Vou dizer-te... Aqui consigo falar com quem perdi.
É uma conversa "muda", onde apenas falo eu, digo o que sinto, o que penso, com lágrimas, sem lágrimas...
mais triste, menos distante... depende o estado de espírito.
Criei este blogue para falar com as pessoas que perdi. E então porque só agora estou a falar contigo?
Porque eu, a ti, não te perdi. Tu foste fazer aquilo que dizias que farias, tomar conta do teu primeiro neto.
Disseste que ele tinha "ido" para te reservar um lugar. E eu sei que sim. Sei que ele te esperava, com um lindo sorriso.
Paizinho! Talvez perca por ser tarde, mas não! Acho que ainda vai a tempo.
Ando cansada, atarefada, mas ao mesmo tempo, algo me faz esquecer um pouco a desilusão, as angústias, os momentos de desânimo porque tenho passado. Nunca foste de me ouvir, nunca tinhas tempo para mim, como tu dizias, eu era forte, eu conseguia, "eu sei que tu consegues,... tu nãoo precisas de ajuda,...tu és forte L....., tu ...!" Sempre palavras, não sei se de coragem se de confiança. Penso que mais a segunda, e por isso, sempre tentei que a tua confiança nunca fosse traída.
Tu dizias que eu não precisa de "mimos", que era mais forte que os meus irmãos, que era mais corajosa e aventureira que eles, e aí, sem te aperceberes de como me magoavas, sem te aperceberes de quanto eu precisava dos teus mimos, sem te aperceberes de como eu gostava que também pegasses em mim ao colo, andasses como às cavalitas, tu ias-me dizendo "tu és capaz ..., tu consegues..., tu vais.. ", e eu tentava mostrar força, capacidade, e por dentro o meu coração chorava, mas não podia deixar-te ficar mal. Quantas vezes o que me dizias, as atitudes que tinhas comigo, as responsabilidades que me davas, me levavam a pensar que não gostavas de mim como dos meus irmãos. Mas logo a seguir, me vinha o pensamento do que me dizias e o que diziam as pessoas "tu és forte! tu não precisas de mimos" tu não precisas de ajuda!", ou te ouvi fazeres um elogia perante os teus colegas e amigos sobre mim, e via a confiança que também eles tinham em mim "Ela é pequenina mas tem garra, tem genica...", "os homens não se medem aos palmos e a prova está nela..."! Quantas vezes Paizinho eu te ouvi e ouvi outros dizerem isto sobre mim. Quantas b«vezes me apeteceu gritar "Não! Eu não sou tão forte assim, EU TAMBÉM QUERO COLO!". Mas não te podia desiludir, não te podia deixar ficar mal.
Que responsabilidade eu tinha sobre os meus ombros, frágeis, pequenos, mas quanto orgulho tu tinhas em mim.
Mas porque nunca mo disseste abertamente? Porque o sabia por te ouvir, sem tu saberes, dizeres aos outros? Quantas vezes esperava um elogio teu?
Cheguei a tê-los, não nego. Mas mesmo esses me causaram alguns constrangimentos embora me fizessem sentir orgulhosa, mais por saber que te fazia ficar orgulhoso.
Em tudo que participava era para ganhar, toda agente contava comigo, os meus amigos queriam-me no grupo quando tocava a competição, os prémios eram meus. Escuteiros, ginástica, e nos estudos.
Que orgulho sentias quando eras chamado para te comunicarem que eu estava no Quadro de Excelência com a melhor nota, que orgulho sentias quando eu ganhava mais um prémio numa actividade ou concurso em que participava, desde composições, construções na areia, bordados, ginástica,... como fiquei triste, não por mim mas sim por ti, quando numa prova de atletismo fiquei em segundo lugar...! Disseste que não, mas eu senti que sim. Como eu ficava triste quando subias a corda com os meus irmãos, e a mim dizias-me "sobe..., de que estás à espera?", e eu subia.
Que contente que eu ficava por te ver orgulhoso, mas que triste porque "não me mimavas". Que contende que eu ficava quando nos trabalhos da escola que tu nos punhas a fazer nas férias, eu cumpria tudo direitinho e fazia tudo "na perfeição" como dizias, e lá ganhava mais um prémio que fazias questão de dar "ao que cumprisse as tuas regras" e os prémios eram todos meus e eu via os meus irmão ficarem desiludidos porque sabiam que eu ia ganhar.
Como eu sei o quanto ficaste triste quando te disse que não queria ser professora primária. Era o teu sonho!
Nunca te ouvi falar de nenhuma profissão para os meus irmãos, mas de mim dizias sempre "ela vai dar uma excelente professora primária", e embora adorasse crianças, eu sabia que esse sonho era só teu, mas estava disposta a realizar-to. Apenas por ti.
O destino pregou-nos uma partida, e tu adoeceste, e nunca tive coragem de te dizer qual era o meu sonho.
A minha vida parou.
Pouco depois dei um rumo à minha vida. Bem ou mal, o rumo que eu quis. Eu queria tanto ser mãe. Dizias que era muito nova, que era cedo, mas esse era o meu maior sonho. Realizei-o... mas... Deus resolveu castigar-me e levou-me aquilo porque eu realmente lutei, O MEU FILHO!
Ainda hoje me pergunto porquê? Penso que foi a primeira vez que te vi chorar, e aí senti que realmente tu também sofrias comigo, mas mais uma vez te ouvi dizer "ela é forte, ela vai superar...", e mais uma vez eu escondi o meu desespero, o meu sofrimento.
O tempo passou. Não fui capaz de te dar o neto que tu tanto querias. Falhei! EU NÃO FUI CAPAZ! Desiludi-te (pensava eu)...
Pai! Hoje tento colmatar as perdas que tenho tido. Hoje meti-me em mais uma aventura. Por ti vou tentar conseguir! Por mim também, pelas meninas que me incentivaram muito, mas, acredita, é mais por ti.
No dia que partiste, o meu irmão mais velho pediu-me para o fazer, por ti "L..... tira um curso superior! O Paisinho ia ficar tão contente!" Eu perguntava para quê? Nesta idade? Com tudo o que tinha para fazer?
Não me esqueço das palavras dele quando eu disse "-Agora? Ele já não vê o resultado, já não vai usufruir dessa satisfação" e a resposta foi "Esteja o Paisinho onde estiver vai ficar muito orgulhoso se o fizeres". Mais uma responsabilidade...
O tempo passou, 7 anos já se passaram, mas tu sabes quais as minhas prioridades... AS MINHAS PRINCESINHAS. Agora já quase não precisam de mim, agora precisava de dar uma reviravolta na minha vida, por questões que felizmente aconteceram depois de partires e tu nunca chegarás a saber, questões que me fizeram e fazem sofrer...
O meu coração chora todos os dias, pelo meu Anjinho, por ti, pela ausência e a distância das meninas que têm que seguir o seu caminho, e por um amor que me feriu o peito, e quanto mais o tempo passa, mais ele sangra.
Porque não te falei mais cedo? Porque não te falei quando consegui ter boa nota no exame?
Falta de coragem, poderia parecer vaidade. Eu estava contente realmente, não o nego. Talvez até um pouco vaidosa, ou melhor, talvez orgulhosa, não por mim mas pelas meninas, por ti, pelo meu irmão que estava à espera desta decisão desde que nos deixaste, pela minha mãe, etc.
Passei com boa nota, mais uma etapa... candidatar-me ou não... Depois disto, não te podia deixar ficar mal, desistir, tu sabes que eu nunca fui de desistir, e aí, mais uma aventura, mais um desafio, senti a tua força a dizer-me "vai em frente... tu vais conseguir... tu és capaz...". E aqui estou. Não vou fazer o que tu querias, ser professora primária, mas vou tentar tirar um curso que embora não seja o que queria na altura, é um curso que penso se adequa à minha pessoa, que gosto. Farei alguma coisa com ele? Talvez não. Já é tarde, mas servirá para te fazer ficar uma vez mais, orgulhoso, e te "ouvir" dizer "Eu sabia que eras capaz...", quem dera não te desiluda....
Paizinho! Não sabes o erro que cometi, ninguém sabe. É um segredo que morrerá comigo, embora muitas vezes me apeteça gritar para que todo o mundo saiba que o meu coração chora... por alguém que apenas me causou sofrimento.
A ti tenho que pedir desculpa, porque aí sim, FALHEI!
Eu sempre te disse que não haveria homem nenhum que me fizesse chorar, e não consegui cumprir o que te disse... Falhei... por amar demais quem tanto me faz sofrer, ainda...

Hoje, não tenho hipótese te falar contigo, de ver o teu olhar, deixo-te aqui esta conversa, só minha mas sei que tu me ouviste!

Um Beijo
"Narizinho"

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